(2) Nos termos do artigo 26.o, n.os 1 e 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), a União adota as medidas destinadas a estabelecer ou a assegurar o funcionamento do mercado interno, que compreende um espaço sem fronteiras internas no qual é assegurada a livre circulação de bens e serviços.
O artigo 169.o, n.o 1 e n.o 2, alínea a), do TFUE estabelece que a União contribui para assegurar um elevado nível de defesa do consumidor através das medidas adotadas nos termos do artigo 114.o do TFUE no contexto da conclusão do mercado interno.
A presente diretiva tem como objetivo estabelecer o justo equilíbrio entre a consecução de um elevado nível de defesa do consumidor e a promoção da competitividade das empresas, assegurando ao mesmo tempo o respeito do princípio da subsidiariedade.
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(3) Convirá harmonizar certos aspetos relativos aos contratos de compra e venda de bens, tendo como base um nível elevado de proteção do consumidor, a fim de alcançar um verdadeiro mercado único digital, reforçar a segurança jurídica e reduzir os custos de transação, designadamente para as pequenas e médias empresas (PME).
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(5) A evolução tecnológica propiciou o crescimento de um mercado de bens que incorporam ou estão interligados com conteúdos ou serviços digitais.
Devido ao número crescente de tais dispositivos e à sua aceitação em rápido crescimento pelos consumidores, é necessária uma ação a nível da União, a fim de garantir um elevado grau de proteção dos consumidores e reforçar a segurança jurídica no que respeita ao regime aplicável aos contratos de compra e venda destes produtos.
O aumento da segurança jurídica ajuda a reforçar a confiança dos consumidores e dos vendedores.
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(6) As regras da União aplicáveis às vendas de bens ainda se encontram fragmentadas, embora as regime relativo às condições de entrega e, no que se refere a contratos à distância ou celebrados fora do estabelecimento comercial, os requisitos de informação pré-contratual e o direito de retratação já tenham sido plenamente harmonizados pela Diretiva 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (3).
Outros elementos-chave contratuais, tais como os critérios de conformidade, os meios de ressarcimento por incumprimento do contrato e as principais modalidades para o seu exercício, estão atualmente sujeitos a uma harmonização mínima nos termos da Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (4).
Os Estados-Membros foram autorizados a ir além das regras da União e a introduzir ou manter normas que assegurem um nível ainda mais elevado de proteção do consumidor.
Tendo feito isto, agiram com base em diferentes elementos e em medidas diferentes.
Por conseguinte, as disposições nacionais que transpõem a Diretiva 1999/44/CE divergem atualmente de forma significativa relativamente a elementos essenciais, tais como a ausência ou existência de uma hierarquia de meios de ressarcimento.
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(8) Embora os consumidores beneficiem de um nível elevado de proteção quando compram no estrangeiro em resultado da aplicação do Regulamento (CE) n.o 593/2008, a fragmentação jurídica afeta também negativamente os níveis de confiança dos consumidores nas transações transfronteiriças.
Embora vários fatores contribuam para esta desconfiança, a incerteza sobre os principais direitos contratuais destaca-se entre as preocupações dos consumidores.
Esta incerteza verifica-se independentemente de os consumidores estarem ou não protegidos pelas normas imperativas aplicáveis aos contratos celebrados com os consumidores do seu próprio Estado-Membro nos casos em que os vendedores orientam para estes as suas atividades transfronteiriças ou em que os consumidores celebram contratos transfronteiriços sem que o respetivo vendedor exerça atividades comerciais no Estado-Membro do consumidor.
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(9) Embora as vendas em linha de bens constituam a grande maioria das vendas transfronteiriças na União, as diferenças em matéria de direito dos contratos a nível nacional afetam tanto os retalhistas que utilizam canais de venda à distância como os que exercem a venda presencial de bens, impedindo-os de expandir as suas atividades além-fronteiras.
A presente diretiva deverá abranger todos os canais de venda, a fim de criar condições equitativas para todas as empresas que vendem bens aos consumidores.
Ao estabelecer regras uniformes para todos os canais de venda, a presente diretiva deverá evitar qualquer divergência suscetível de criar encargos desproporcionados para o número crescente de retalhistas de todos os canais da União.
A necessidade de manter a coerência das regras relativas às vendas e às garantias para todos os canais de venda foi confirmada no âmbito do balanço de qualidade da Comissão do direito em matéria de proteção dos consumidores e de comercialização, publicado em 27 de maio de 2017, que abrangeu também a Diretiva 1999/44/CE.
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(10) A presente diretiva deverá abranger as regras aplicáveis às vendas de bens, inclusive bens com elementos digitais, apenas em relação aos elementos-chave contratuais necessários para superar os obstáculos relacionados com o direito dos contratos no mercado interno.
Para este efeito, as regras em matéria de requisitos de conformidade, meios de ressarcimento à disposição dos consumidores por falta de conformidade dos bens com o contrato e principais modalidades para o seu exercício devem ser plenamente harmonizadas e o nível de proteção do consumidor, em comparação com a Diretiva 1999/44/CE, deverá ser aumentado.
A harmonização plena de regras relativas a alguns dos elementos essenciais do direito aplicável aos contratos celebrados com consumidores tornará mais fácil para as empresas, em particular as PME, oferecer os seus produtos noutros Estados-Membros.
Os consumidores beneficiarão de um nível elevado de proteção do consumidor e de ganhos de bem-estar com a harmonização plena das principais regras.
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(24) A fim de equilibrar a necessidade de segurança jurídica com uma adequada flexibilidade das normas jurídicas, qualquer referência na presente diretiva ao que se pode esperar de ou por uma pessoa deverá ser entendida como uma referência ao que pode ser razoavelmente esperado.
O nível de razoabilidade deverá ser verificado de forma objetiva, tendo em conta a natureza e a finalidade do contrato, as circunstâncias do caso e os usos e práticas das partes envolvidas.
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(28) Uma vez que os conteúdos e serviços digitais incorporados ou interligados com os bens estão em constante evolução, os vendedores podem acordar com os consumidores o fornecimento de atualizações relativas a esses bens.
As atualizações, tal como acordadas no contrato de compra e venda, podem melhorar e elevar o nível dos elementos de conteúdos ou serviços digitais dos bens, alargar as suas funcionalidades, adaptá-los à evolução técnica, protegê-los de novas ameaças à segurança, ou servir outros fins.
Por conseguinte, a conformidade dos conteúdos ou serviços digitais incorporados ou interligados com os bens deverá também ser avaliada em relação à atualização dos elementos de conteúdos ou serviços digitais destes bens de acordo com o estipulado no contrato de compra e venda.
A não disponibilização de atualizações que tenham sido acordadas no contrato de compra e venda deverá ser considerada uma falta de conformidade dos bens.
Além disso, as atualizações defeituosas ou incompletas deverão também ser consideradas uma falta de conformidade dos bens, visto que tal significaria que essas atualizações não são executadas de acordo com o estipulado no contrato de compra e venda.
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(39) Os bens com elementos digitais deverão ser considerados entregues ao consumidor quando a componente física dos bens tiver sido entregue e o ato único de fornecimento do conteúdo ou serviço digital tiver sido efetuado ou o fornecimento contínuo do conteúdo ou serviço digital durante um determinado período tiver tido início.
Tal significa que o vendedor deverá também tornar o conteúdo ou serviço digital disponível ou acessível ao consumidor de forma a que o conteúdo ou serviço digital, ou qualquer meio adequado para o descarregar ou para aceder ao mesmo, cheguem à esfera do consumidor e não seja necessária nenhuma outra ação por parte do vendedor para permitir ao consumidor utilizar o conteúdo ou serviço digital nos termos do contrato, por exemplo, através de uma hiperligação ou de uma opção de descarregamento.
Por conseguinte, o momento adequado para determinar a conformidade deverá ser o momento em que o conteúdo ou serviço digital é fornecido, caso a componente física tenha sido entregue num momento anterior.
Desta forma, é possível assegurar um momento uniforme para o início do período de responsabilidade aplicado ao componente físico, por um lado, e ao elemento digital, por outro.
Além disso, em muitos casos, não será possível ao consumidor detetar um defeito na componente física antes de o conteúdo ou serviço digital ter sido fornecido.
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(41) A fim de assegurar a segurança jurídica para os vendedores e a confiança global dos consumidores nas compras transfronteiriças, é necessário prever um período durante o qual o consumidor tem direito a meios de ressarcimento por qualquer falta de conformidade existente no momento pertinente para a determinação da conformidade.
Tendo em conta que, na aplicação da Diretiva 1999/44/CE, a grande maioria dos Estados-Membros previu um período de dois anos e, na prática, este é considerado pelos participantes no mercado como um período razoável, esse período deverá ser mantido.
O mesmo deverá aplicar-se no caso de bens que apresentam elementos digitais.
No entanto, caso o contrato preveja o fornecimento contínuo por um período superior a dois anos, o consumidor deverá ter direito a meios de ressarcimento por qualquer falta de conformidade do conteúdo ou serviço digital que ocorra ou se manifeste no período durante o qual o conteúdo ou serviço digital deverão ser fornecidos nos termos do contrato.
A fim de assegurar flexibilidade para que os Estados-Membros aumentem o nível de proteção dos consumidores no seu direito nacional, os Estados-Membros deverão ser livres de fixar prazos mais longos para a responsabilidade do vendedor do que os prazos estabelecidos na presente diretiva.
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(46) Os Estados-Membros deverão ser autorizados a manter ou introduzir disposições que prevejam que, a fim de usufruir dos seus direitos, o consumidor tenha de informar o vendedor de uma falta de conformidade num prazo de, pelo menos, dois meses a contar da data em que a tiver detetado.
Os Estados-Membros deverão ser autorizados a assegurar aos consumidores um nível de proteção mais elevado não introduzindo uma obrigação desse tipo.
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(48) Relativamente à reposição dos bens em conformidade, o consumidor deverá poder escolher entre a reparação e a substituição.
Permitir que os consumidores exijam a reparação deverá incentiva um consumo sustentável e poderá contribuir para uma maior durabilidade dos produtos.
A escolha do consumidor entre a reparação e a substituição apenas deverá ser limitada quando a opção escolhida for jurídica ou factualmente impossível ou quando, em comparação com a outra opção disponível, imponha ao vendedor custos desproporcionados.
Poderia ser desproporcionado, designadamente, solicitar a substituição dos bens devido a um pequeno risco se tal acarretasse custos significativos e, simultaneamente, o risco pudesse ser facilmente reparado.
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(70) Atendendo a que o objetivo da presente diretiva, a saber, contribuir para o funcionamento do mercado interno mediante o combate, de forma coerente, aos obstáculos relacionados com o direito dos contratos em matéria de vendas transfronteiriças de bens na União, não pode ser suficientemente alcançado pelos Estados-Membros, dado que nenhum Estado-Membro pode individualmente lutar contra a fragmentação atual dos regimes jurídicos, garantindo a coerência do seu direito com o dos outros Estados-Membros, mas pode, suprimindo os principais obstáculos ligados ao direito dos contratos através da plena harmonização, ser mais bem alcançado ao nível da União, a União pode tomar medidas, em conformidade com o princípio da subsidiariedade consagrado no artigo 5.o do Tratado da União Europeia.
Em conformidade com o princípio da proporcionalidade, consagrado no mesmo artigo, a presente diretiva não excede o que é necessário para alcançar esse objetivo.
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